sábado, setembro 24, 2005

Ornejar Paliativo

A coisa nefasta já começou e a hipocondria misantrópica já está de tal forma entranhada que a indolência apodera-se muitas vezes do meu corpo, e nem uma injecção de cafeína e adrenalina directamente no córtex nervoso me poriam agitado.

Hoje, depois de demorar pouco mais de uma hora a almoçar, expandi-me sobre a cama para ler mais um bocado d'um livro escrito por um guru da parvoíce.

Isto de me expandir sobre a cama é uma posição intermédia entre estar sentado e deitado. Uma posição tal que leva todos os músculos a relaxar e a encontrarem a plena descontracção (não comentarei piadas derivadas de mentes com o néctar da podridão humana lá alojado, que instantaneamente se perguntaram se nesta posição sofreria de flatulência incontrolada). Uma posição que nos sentimos atraídos e puxados pela cama, apesar de já estarmos em pleno contacto com ela, uma sensação tão forte que a cama mais parece um magneto gigante. Conseguimos vislumbrar, por breves instantes e na sua totalidade, a lei da atracção dos corpos, tal como explicada por Isaac Newton. Um conforto tal que, comportamentos que de outra forma pareceriam absurdos, irão parecer bastante plausíveis desde que não nos tenhamos que mexer. Entramos num estado fronteira entre estar acordado e estar a dormir, onde o tempo passa sem se dar por ele, uma máquina de aceleração temporal que faz com que tudo à nossa volta pareça estar parado. Mesmo que fosse baleado por 15 gangster munidos de Thompson M1928 (o célebre "Piano de Chicago") certamente não obteriam qualquer movimento da minha parte, todo o pedaço de mim já estava no local de energia potencial nula, muito menos tombaria ou saltaria, o que faria de mim um mau figurante para um filme de acção passado nos anos 30. Aliás... mesmo que os visse entrar no quarto a minha inércia só me permitiria pensar "também não me importa...".

Acordei uma hora depois, atordoado e em aflição porque uma empalhadora de feno dizimou, perto da minha casa, uma manada cães (do americano corrente "quem's manade"). Geralmente acordo com metade da cara mergulhada numa poça de baba e todo torcido sem me conseguir localizar no tempo, como quem acorda no hospital, sem se aperceber da sorte de ter sobrevivido, depois de ter levado a tareia da sua vida por ter não ter as contas saldadas com a máfia russa devido a uma dívida remetente à contrafacção de calendários eróticos. É comum usar-se o termo "matilha" ou bando de cães", mas, pelo barulho, eram mais de 850 e bem corpulentos, por isso o termo "manada". Levantei-me sem pensar no trauma que me poderia causar ver tamanha quantidade de carne cortada aos escalopes, e dirigi-me à cozinha. Só algum tempo depois consegui associar tal barulho à parte do programa, da máquina de lavar roupa, intitulado "Hidroextracção". Se houver algum projecto do Estado para fazer limpezas cerebrais de certo que usam máquinas de lavar roupa a funcionar ininterruptamente neste modo.
Aquele barulho conjugado com o de um aspirador leva à morte instantânea por derrame cerebral múltiplo, é que o ruído produzido tem a frequência exacta para todas as veias e artérias cefálicas colapsarem.


Seguindo para o tópico "férias - um oásis utópico para além do deserto", vou escrever, com a mesma brevidade do acontecimento, sobre o ter ido acampar a Monte Gordo.

Eu tinha algumas ideias pré-concebidas sobre ir acampar... não que alguma fez o tenha feito, mas estava com esperança que desta vez fosse diferente.


Era minha intensão levar uma pressão de ar para matar coelhos para o jantar. Esfolá-los em frente à tenda para atrair bichos e mete-los num espeto para os assar num enorme incêndio florestal. Se nada disto tivesse resultado com a mesma pressão de ar conquistava-se comida aos outros.

Antes de seguirmos viagem o Vencislis contou-me, em tom de quem conta uma lenda, de numa certa vez que foi acampar, ao invés das saladinhas típicas de malta de extrema-esquerda, tinha levado cabeças de borrego guisadas para uma das refeições e que, depois de terminado o festim, tinha empalado as caveiras à porta do avançado da tenda, para afastar o inimigo. Desta vez nem latas de atum a secar para serem reutilizadas como sapatos para anões, para pendurar no espelho central do carro ou mesmo para servirem de penico de algibeira (nunca se sabe quando a vontade aperta).

Tentei meter o fogareiro no meio da tenda para servir de aquecimento central, mas não foi preciso, o pelo do "esquilo humano" emanava calor animal suficiente. Por falar em fogareiro... eu a fazer lume! Não vejo, mais uma vez, que terror é que pode provocar uma pequena labareda de 2 metros num fogareiro de 15cm de raio. A caruma estar toda a arder nas imediações do fogareiro, faz parte do protocolo e está tudo mais que controlado, caso contrário a carne não fica assada como deve ser.

Uma outra actividade possível seria gritar de terror com os pulmões cheios, como quem encontra o frio da morte pela lâmina quente de um punhal espetado no estômago, às 5 da manhã e voltar a dormir como se nada se tivesse passado, é uma sensação muito libertadora e, para além do mais, revigora o sentido de alerta dos outros companheiros de campismo. Em alternativa, infelizmente só me lembrei uns dias depois aquando da companhia dos meus pais (e diga-se que tal presteza não foi de todo bem recebida) poderia ter imitado o ornejar azurzidado (que vem de "zurzido") de Primavera de um macho alfa de um bando de macacos narigudos de pelo curto e dorso dourado. Geralmente ecoa por mais de 70Km e atrai todas as fêmeas ao seu encontro, que, logo ao primeiro contacto auditivo, ficam com orvalho por entre os membros locomotores traseiros.

Não quis levar estacas para prender tenda para poupar no peso, mas já estavam dentro do saco da tenda e não tive para as tirar. É um desperdício de trabalho, há lá tanta estaca espalhada, quase todas atadas a cordas para estarem bem sinalizadas e não se perderem.

Também me deparei com a seguinte questão: ir urinar à retrete onde todos o fazem ou, de forma muito mais higiénica e natural, fazê-lo aos pequenos jactos (para poupar) para cima da tenda dos outros e marcar mais um pedacito de território.


Voltei a Ayamonte, desta vez à noite e acompanhado por amigos, e comemos tapas... o Tony Jezué (que sabe o que quer e é muito esperto) também o fez e com um especial pedido "Quiero tapas mas bien passadas! Ouvistésh?"

Sem saturar muito o tema da praia (que alguém muito específico me disse que já era um assunto muito batido e fácil de falar) vou só recordar um pequeno episódio lá sucedido:
Eram umas duas da tarde e, sob um tórrido sol, uma pequena sombrinha, propriedade alheia, albergou 3 forasteiros que se meteram em posição de etíope em campo de refugiados (agachados de cócoras quase sentados no chão, cabeça esticada para a frente para apoiarem os queixos nos joelhos, olhar vazio, ar apático e boca semi-aberta a cuspir moscas, braços ao longo do corpo e com as costas das mãos no chão) que estavam perto de alcançar uma insolação, o que vale é que os donos tinham ido almoçar (segundos os nossos rigorosos cálculos), bom... a rigor estavam a 1.30 metros da sua propriedade e não tinham ido almoçar. Mas tudo são pormenores que em nada tiram a sua simpatia. Tiveram pena dos indígenas que pareciam tão inofensivos e era nitido que padeciam de um mal enfermo por excesso de sol na cabeça...


Visto que o outro post estava, segundo alguns, demasiado grande (sublinhe-se o "demasiado"), tentei fazer este mais rápido e curto.

Aqui poderia haver dois tipos de piadas grosseiras e francamente ordinárias: o da "voz off" (que nem sei se é isto, mas parece um termo técnico sonante) - "tira, tira quero ir fazer não sei quê!", "Uiii... qu'isso não cabe tudo cá dentro" ou ainda remeter para o estudo científico, que me contaram, sobre o sentimento de inferioridade que os espectadores de vídeos de luta greco-romana mista sentem ao verem a sobrante virilidade do "artista" masculino.

Optei, como sempre o faço, por não dizer nenhuma das duas.

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