quarta-feira, dezembro 17, 2003

O Bate-Chapas da Arroja

Apanhei hoje o autocarro 36 que vinha de Odivelas... para tal tive que ir a pé até ao Lumiar.
Já dentro do autocarro e sentado, naquele lugar sobre as rodas de trás que ninguém quer (o 36 não costuma ter os famosos lugares dos parolos, aqueles que se fica frente-a-frente com outros passageiros), entra um "cavalheiro" todo ele cheio de "carácter". Para mal dos meus pecados sentou-se ao meu lado e por que um azar nunca vem só (ou como raio se diz), conhecia o "chefe" que estava sentado atrás de mim. Ora bem, assim que o sujeito se sentou veio-me cá um hálito do jantar às papilas olfactivas (de certeza que é uma "pessoa" que come muito alho... que por sinal faz bem), e o que me fez ter uma contracção muscular involuntária, foi o cheiro a cabelo oleoso que invadia o habitáculo. Muito directo ao assunto, começou a discursar em todas as direcções, embora dando a entender que era para o seu amigo, bem... conhecido é o termo mais correcto :

- Esta sociedade anda mal... anda contaminada! No meu tempo não era nada disto... estes jovens não tem alma (eu ao lado...), metem nojo! (...) No meu tempo se alguém era atropelado juntava-se tudo à volta para dizer "ai... coitadinho! Está tão mal...", "Ai credo! Que horror... está com tão mau aspecto", agora não... é só meia dúzia deles e chamam logo a ambulância. Já não há compaixão pela vítima!
- Pois é, tem razão...
- Mas já no tempo de antigamente, quando estive em Inglaterra, á era a mesma coisa... eram todos muito frios! Se caía alguém, só dois é que ajudavam, o resto nem ligava!
- Mas na sua terra já eram assim? Qual terra?
- Em Inglaterra... Irra!

(...)

- O meu amigo é mecânico, não é? (perguntou a alma penada, sentada no banco atrás)
- Eu? Eu sou é bate-chapas. Quem trabalha comigo é que é um belíssimo mecânico, que mãozinhas... que mãozinhas.

(...)

- Ainda há pouco tempo comprei 4 camiotes de serviço às Santa Casa. Que vigaristas! (Com muita pena minha não me lembro das palavras que ele usou em vez de 'vigaristas', mas fartei-me de rir) Uma estava sem documentos, recusei-a logo (yah boa... comprar um carro sem documentos, lol), outra não tinha motor de arranque e outra estava com os injectores todos arrebentados. A quarta é a que está melhorzinha, mas não tem força.

(...)

- Eh pah! Ainda bem que me lembro... tenho um carrinho mesmo bonzinho para o meu amigo... um Audio (Audi) 80 Turbó-Disle (TD). O meu amigo mete-lhe lá um motor arranjadinho à maneira e tem ali um carro para a vida toda! (É só ir à merceairia e pedir para aviar dois motores e para embrulhar em papel vegetal)
- Hum... não é bem o meu género... já agora é de que ano?
- É de oitenta e... bom! É de quase noventa! Mas já agora que tipo de viatura é que o meu amigo quer? Talvez possa dar um geito...
- Ando inclinado para um Opel Astra de 2000/2001...
- A disle? Isso ainda é caro... a gasolina são uns mamões FDP! Eu tenho tudo a disle...
- Não. A gasolina, ando à procura de um que seja de serviço de uma empresa que tenha cuidado com as revisões...
- Tu não te metas nisso! Olha que os carros vêm todos avariados! (Ahh! Com que então o inexorável sabichão foi escaldado...) A não ser que o condutor tenha cuidado e que (granda confusão e contradição no discurso)

(...)

- Estas a morar aonde agora? (Perguntou o de "cá de trás", salvo seja)
- Onde sempre morei... na Arroja!

Pronto... apartir de aqui fez-se luz na minha cabeça. Tudo começou a ser claro como água cristalina e pura. Tudo começou a fazer sentido. Um bate-chapas da Arroja! Já nem consegui ouvir mais da conversa que estava a ser obrigado a ouvir... tinha acabado de descobrir mais um estereótipo exótico, o curioso "Bate-chapas da Arroja". Estes seres da Arroja têm características muito peculiares, sentido de humor um tanto ou quanto limitado (o humor é relativo... pode ser em relação a alguém e esse alguém não achar piada, talvez seja esta a desculpa...). É melhor não escrever mais sobre os naturais da Arroja, não vá a Besta tricotá-las, e a alguém de lá ler isto e depois vir com más intenções...


Até à próxima,
'jinhos e abraços ;o)

PS: Escrevi muito hoje... esta história do bate-chapas é verídica, mais coisa menos coisa. Não tenho nada contra os bate-chapas, tenho um primo que o é. Hum? As pessoas da Arroja o quê?

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